A questão permanece.
Um feto humano é ou não é um ser com direito à Vida e à protecção da Lei?
Se um feto não é uma Vida, se não merece a protecção das Leis humanas, como alegam os abortistas em todo o mundo, então não parece haver razão para que continue a ser criminalizada uma mulher (ou um homem) que provoque um aborto a uma grávida sem o consentimento desta. Se "aquilo" dentro do ventre materno até às 10 semanas não é nada, não existe, não "é", então não há crime que se possa praticar contra "algo" que não existe. Sendo assim, alguém que agrida uma grávida (que já poderá apresentar notórios sinais exteriores do seu estado)provocando-lhe a perda da feto antes das 10 semanas, segundo a lógica abortista, não deverá ser punido senão pela agressão à mãe, passando a circunstância da gravidez a não poder ser invocada como agravante para o agressor.
Será isto aceitável ou mesmo desejável no entendimento dos portugueses e portuguesas que serão chamados a referendo em Fevereiro de 2007? Estou em crer que não.
Ao contrário, se de facto o feto é realmente "um nada que é tudo", uma Vida Humana com potencial de desenvolvimento e felicidade futuros, então devem estar legalmente previstas penalizações para quem quer que lhe faça mal - sendo a morte o pior de todos aqueles males.
O Estado de Direito surgiu na base do princípio de que todos são responsáveis perante a Lei, contra os privilégios de classe no "ancien régime". Esse princípio sustenta que para cada crime esteja prevista uma moldura penal, e não exista qualquer lista de dispensados de responder em tribunal. Aí e só aí pode o Juiz determinar a inocência ou culpa e considerar eventuais circunstâncias atenuantes.
Defender a descriminalização pura e dura do aborto praticado ou pedido pela própria mãe, na prática a liberalização do aborto até às 10 semanas, significa que se defende o regresso ao regime de privilégios e o fim do Estado de Direito. Legalizar o aborto a pedido da mãe sem qualquer justificação como as já previstas na actual lei, criará uma situação de privilégio para um acto que, praticado ou determinado por outra qualquer pessoa, se continua a reconhecer como gravemente criminoso.
Ora um aborto não é um suicídio, não é um acto contra si próprio ou contra uma parte de si próprio. Se o fosse, o legislador teria que estar certo de que até às 10 semanas (e porquê nessa altura?) o feto era uma parte da mãe e logo a seguir deixava de o ser. Pois com que justificação se poderia continuar a considerar um crime logo no dia a seguir, o que antes o não era?
As leis da nossa sociedade não se podem fazer com a mesma ligeireza e arbitrariedade com que se elaboram as regras de um qualquer jogo. E o que está directamente em decisão no próximo referendo é uma Lei. O que os portugueses vão decidir é sob que lei do aborto querem viver: ética ou desresponsabilizadora? Séria ou facilitista? As Leis a que aceitamos submeter-nos precisam de um fundamento moral, científico e/ou ético que, no caso em apreço, deve necessariamente esclarecer por que é que uma mãe que, sem razão, aborte até às 10 semanas não é uma criminosa e outra que aborte logo a seguir já o é. Esta, parece-me, é que é a questão!
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