segunda-feira, agosto 20, 2007

sem "serviços mínimos" um imposto é imoral

Sumário
Um princípio de elementar justiça e protecção ao consumidor está a levar a que as empresas mais responsáveis comecem a compensar os seus clientes quando o serviço prestado não corresponde ao esperado. Assim, o serviço ALFA da CP devolve o valor do bilhete quando o atraso numa viagem Lisboa-Porto ultrapassa uma hora. Assim também a proposta (aceite?) de Rui Rio aquando da sua primeira candidatura à Câmara Municipal do Porto. Propunha ele que se impusesse à Brisa a redução do custo das portagens quando, por motivos de obras (causando grandes demoras) os clientes não vissem satisfeita a sua expectativa de uma viagem mais rápida. Era o caso das (intermináveis) obras de alargamento do A1 na saída do Porto para Lisboa.

Da mesma forma, nós propomos que o "cidadão" - cujo estatuto diante do Estado não deve ter uma dignidade inferior à do mero "consumidor" perante uma empresa - veja reduzida a sua contribuição fiscal na medida em que os serviços públicos na sua área de residência sejam significativamente deficitários.

Moralidade dos impostos
Quando alguém dá a sua anuência, implícita ou explícita mas sempre VOLUNTÁRIA E LIVRE, ao "contrato social" fá-lo na expectativa de que com isso ganhará o acesso a um conjunto de "serviços mínimos" a prestar por parte da entidade que lhe pede, ou melhor, que lhe exige o imposto. Daí que, perante a sistemática redução de serviços prestados pelo Estado Português a uma parte dos seus cidadãos, estes - nos quais me incluo - podem a partir de um certo momento começar a sentir que o contrato deixa de lhes interessar e ganham toda a legitimidade para o denunciar em qualquer momento, sem que com isso alguém lhes possa, por outro lado, exigir que se retirem do território. Responderão com Verdade e Razão que a alteração das circunstâncias não lhes é imputável a eles mas ao Estado. E não venham de lá com a possibilidade (teórica) de emigrar ou com a responsabilidade inerente ao direito de voto. Não seriam poucos os cidadãos que, tão mal servidos, de bom grado devolveriam o cartão de eleitor. Conhecemos mesmo alguns que já o fizeram ou consideram vir a fazer.

Vejamos mais em detalhe as circunstâncias que podem levar alguém a adoptar uma ATITUDE mais dura em resposta ao verdadeiro ABANDONO a que se sinta votado pelo Estado Português.


1. Segurança social

O Estado prepara-se para cortar em 40% (e não 20% como anunciado) as nossas reformas, enquanto os actuais reformados gozam à vontade os seus "direitos adquiridos". Qual a moralidade disto? Carregar sempre sobre os "activos e empregados" só porque estão demasiado ocupados a trabalhar e a manter os empregos para poder perder tempo a reclamar os SEUS direitos?


2. Acesso à cidadania

O serviço público de informação (principalmente a RTP) constitui-se como um "plateau" televisivo cujos donos, em cada vez menor número, são aqueles que o sistema considera "não-perigosos" - os velhos senhores... da situação.

Esta é no essencial a conclusão a que chega uma investigação conduzida cientificamente no Centro de Estudos de Comunicação Social da Universidade do Minho pela Prof. Felisbela Lopes. Existe uma clique de "donos do plateau" que exclui linhas de opinião menos ortodoxas... ou alinhadas. Isto mesmo experimentaram diversos pré-candidatos na última eleição presidencial (nos quais nos incluímos) ou na recente campanha para a Câmara Municipal de Lisboa.


3. Acesso à educação

Quantas pessoas não acabam por não encontrar alternativa realista a matricular (pagando mais) os seus filhos no ensino particular. Onde está o "cheque ensino" prometido por Durão Barroso? Como se pode aceitar que alguns, com a escola a muitos quilómetros de distância, estejam a pagar o ensino de outros com ela à porta?


4. Acesso à saúde

Encerramento de Serviços de Atendimento Permanente...

Encerramento de urgências...

Encerramento de maternidades...

O Hospital de Faro transformado em enfermaria da Europa rica... pago pelo Portugal pobre...

E agora... os Centros de Saúde transformados em matadouros humanos ao serviço da política de "aborto de proximidade". Esta Socretina mania da... co-incineração!

Palavras para quê?...


5. Liberdade de circulação

Os cidadãos das áreas metropolitanas de Lisboa e Porto, além de acesso privilegiado a redes de metropolitano que os outros não têm, podem usar auto-estradas e vias rápidas no seu percurso casa-trabalho, enquanto os outros portugueses (percorrendo a mesma distância e tendo como "alternativa" estradas nacionais igualmente congestionadas) não podem. Portugueses de primeira, uns, e os outros portugueses de segunda? Qual a moralidade de algumas SCUTs serem gratuitas e outras não? Foram apenas os seus utentes que as pagaram, ou todos os cidadãos contribuintes? E os cidadãos estrangeiros que usam diariamente a "via do infante", contribuíram também para ela? Com que direito se exige que contribua para a sua manutenção uma cidadã nacional como as largas dezenas que após as últimas reformas na saúde... são levadas a ter os seus bebés dentro da ambulância em condições de grave risco?


6. Liberdade de consciência

Um cidadão deve poder recusar-se a participar com o seu dinheiro em actos que o Estado decida praticar, ainda que sancionados por referendos. Podemos pensar em hipóteses mais ou menos remotas, como a participação numa guerra ofensiva ou a prática da pena de morte. Mas também se pode pôr essa questão em coisas bem concretas e actuais, tais como a "pena de morte" decretada sobre os nascituros com o aval do estado português, através do subsídio público ao aborto.


7. Conclusão

Uma definição maximalista de uma "cidadania plena", deveria reconhecer ao cidadão o direito de optar livremente por se integrar numa sociedade civil, pagando as suas contribuições, usufruindo dos seus serviços, podendo eleger e ser eleito para qualquer cargo político. Mas, enfim, a prática mostrou-nos que um cidadão não é livre apenas por ter o direito de votar. Se aos cidadãos se aplica o princípio da igualdade eles deveriam também ter o direito (real) de ser eleitos e acesso em igualdade de circunstâncias ao "aparelho público de amplificação das mensagens". Demonstrando-se que não têm acesso real a esse Direito (teórico) e que o mesmo Estado não envida esforços sérios e consequentes tendentes à sua INCLUSÃO no sistema, temos de rever a nossa definição de "cidadão livre" numa base minimalista - mantendo então apenas a última parte do entendimento acima.

Um cidadão (ainda) pode ser considerado minimamente livre se puder em qualquer momento escolher a sua posição fora ou dentro de uma determinada sociedade, sem incorrer em "pena" da extradição. Como propunha Thoreau, uma sociedade democrática(?) e tolerante deve mesmo tolerar que alguns dos seus membros se possam alhear dela, viver lado-a-lado como vizinhos respeitosos mas independentes.

Nessa situação, estes cidadãos pagarão os serviços do Estado a que renunciaram "por cada uso", à peça, por unidade. E estes serviços até poderão limitar-se ao trânsito nas estradas, submetendo-se às regras do código gerais (mesmo que voluntariamente tenham prescindido de participar no processo legislativo que conduziu à sua elaboração e reforma). Afinal, como qualquer estrangeiro que visita o país. Claro que nessa circunstância - como ocorre nas transacções entre países comunitários - não pagará IVA pelos seus serviços ou produtos adquiridos.


Enfim, esta questão adquire pertinência especial no momento em que se entrou já na fase de refluxo da presença protectora do Estado, junto dos cidadãos que afinal mais dele precisam. Caducando o argumento de que as zonas não-servidas seriam "zonas AINDA não servidas", o Estado deve uma compensação aos milhares de cidadãos que habitam as regiões que já não chegarão a ser servidas. Nessas regiões, de onde o Estado parece esperar que os cidadãos retirem em boa ordem e silenciosamente, não é justo que fiquem ainda as Repartições da Fazenda Pública - denunciantes silenciosos de um Estado salteador. De um Estado que, ao contrário do velho Zé do Telhado que se diz que roubava aos ricos para dar uma parte aos pobres, rouba aos mais pobres para distribuir pelos ricos!

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